Economia

Paulo Afonso - Bahia - - 08/09/2012

Chesf admite culpa, mas diz que erros em projetos de ICGs ajudaram a atrasar linhas

Por Luciano Costa - Jornal da Energia
Foto Divulgação

A estatal Chesf, responsável pela construção de centrais de conexão compartilhada (ICGs) que iriam escoar a geração de parques eólicos no Nordeste, resolveu admitir a culpa pelo atraso nos empreendimentos, que hoje deixam cerca de 636MW em usinas sem poder produzir energia. Mas o diretor de Engenharia da empresa, José Aílton de Lima, afirma que houve "graves falhas" não somente da Chesf, mas em todo o processo para construção das estruturas.

"A estimativa feita a partir dos processos hoje em curso é de que a Chesf tem de 30% a 40% de responsabilidade nos atrasos. O restante, de 60% a 70%, está fora da empresa", alega Lima, que conversou com o Jornal da Energia.

O executivo aponta como um dos maiores problemas o fato de alguns projetos de ICGs, disponibilizados pelo órgão de planejamento do governo, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), serem "superficiais" e trazerem "incosistências" que só são identificadas após os leilões das obras.

"Não tenho interesse em jogar pedra em ninguém, mas a gente tem que entender as causas das coisas. Na subestação Igaporã (na Bahia) assinamos o contrato de concessão e, quando fomos ver, a subestação não podia ficar no lugar indicado, que era dentro da Mata Atlântica", explica Lima.

Segundo o engenheiro, a busca por uma nova localidade foi feita em conjunto com a Renova, cujos parques estão à espera da estrutura para poder operar. Esse processo levou seis meses e fez com que todo o licenciamento ambiental atrasasse. Até porque, sem a definição de onde ficaria a SE, a empresa não teria como planejar a linha que seria conectada nela.

Em outro projeto, a ICG Extremoz, no Rio Grande do Norte, a posição prevista estava "no meio de um grande loteamento urbano", o que "levou à necessidade de alteração na localização" e complicou os prazos.

"Teoricamente, quem deveria fazer os relatórios para a preparação do leilão era a EPE. Mas ela não tem estrutura suficiente, então delega para os agentes. No caso da ICG Igaporã, a Renova contratou uma empresa que simplesmente não atentou para alguns detalhes", lamenta o executivo da Chesf.

Um modo de evitar esses problemas seria o próprio investidor fazer estudos muito mais aprofundados antes de entrar nos leilões. Mas, segundo Lima, "nenhum empreendedor faz isso", uma vez que significaria um desembolso muito grande sem qualquer certeza de vitória. "Essa, que seria uma solução ideal, representaria antecipar R$4 milhões ou R$5 milhões entre estudos e liberações de terras. É botar muito dinheiro na frente".

Assim, para acelerar os processos, o diretor sugere melhorias nos estudos prévios da EPE e "unificação do tratamento" dado aos projetos pelos órgãos licenciadores. "Os processos estão muito complicados, cada órgão tem uma forma de trabalhar".

O diretor de Engenharia ainda desabafa. "Temos problemas de gestão? Toda organização tem. Agora, não é toda responsabilidade que é nossa. Fica uma coisa muito...maquiavélica. A Chesf ia atrasar por querer? O que a gente ganha com isso? A gente só perde".

"Ninguém é obrigado a participar"
A EPE afirma, em resposta enviada ao Jornal da Energia, que tem a obrigação de fazer apenas um relatório técnico inicial, o R1. Os outros documentos, sobre aspectos ambientais, de equipamentos e conexão, são feitos por empresas contratadas.

Ainda assim, o órgão ressalta que "é de inteira responsabilidade dos empreendedores o cumprimento das obrigações previamente estabelecidas" e que "a eles são oferecidas informações que podem e devem ser complementadas para que os lances dados nos leilões sejam aprimorados por sua conta e risco". Para a EPE, "ninguém é obrigado a participar dos leilões" e "os empreendedores têm que estar a par das exigências dos órgãos ambientais e dos prazos envolvidos".

No caso da SE Igaporã, o planejador afirma que o relatório já apontava que "todas alternativas deverão ter atenção especial ao adentrar em áreas onde há possibilidade de aplicação da Lei 11.428", a Lei da Mata Atlântica. "Os empreendedores tinham conhecimento prévio da situação que iriam encontrar", garante a EPE.

Na SE Extremoz, a nota enviada pelo órgão do governo diz que também "já se tinha conhecimento de que a mesma se localizava em uma zona de expansão urbana" e que, mesmo assim, essa localização foi vista como "a alternativa mais adequada".

Na semana passada, o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, comentou com jornalistas que "algumas empresas pegaram muitas obras e estão atrasando". E disse que "uma parte do problema são investidores que realmente atrasam" e outra é "atraso nos licenciamentos ambientais".

Histórico
No leilão que ofereceu os primeiros três lotes de ICGs eólicas a investidores, em setembro de 2010, a Chesf arrematou todos empreendimentos com um deságio médio de 50%. A previsão era de que tudo estivesse pronto até julho de 2012, quando as usinas que se conectariam a essas estruturas precisavam começar a funcionar.

Segundo cálculo da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o atraso das ICGs (caso fiquem prontas somente em março de 2013) representará um prejuízo de R$377 milhões aos consumidores brasileiros de energia. Isso porque os contratos do certame eólico deixavam claro que os geradores teriam direito a receber a receita caso concluíssem os projetos a tempo - mesmo que estes não pudessem operar por fatores externos.


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