Opinião

Paulo Afonso (BA) - 10/01/2011

O jogo das mudanças

Dr. Pimenta

A mudança de governantes sempre enseja especulações e reflexões. Mais as primeiras que estas. Quase todas, porém, têm a ver com as expectativas dos cidadãos, especialmente dos que esperam pela oportunidade de verem contemplados seus sonhos e aspirações. Embora não foi vez de eleições municipais, vejam a composição da nova mesa diretora do poder legislativo municipal: novos rumos.
Entramos o ano de 2011, testemunhando a que terá sido das mais tranquilas passagens do poder, no Brasil. Pela primeira vez, o País será governado por uma mulher. Isto, depois de termos experimentado oito anos do governo de um ex-operário. Essa circunstância, por si mesma, indicaria substancial alteração na sociedade brasileira, em que pese a renúncia a alguns compromissos de um e da outra.
De qualquer maneira, o Brasil de 2011 guarda diferença significativa daquele de 2002. A tal ponto, que a presidente eleita, com vantagem de mais de doze milhões de votos sobre seu concorrente, jamais havia disputado uma eleição. A presidência da República, assim, mostra-se alcançável também por quem não ostenta, no currículo, extensa e intensa participação em eleições. Por si só, isso constitui enorme novidade, sobretudo se consideradas as reiteradas e frustradas tentativas de Luís Inácio Lula da Silva, até subir a rampa do Planalto. Nesse entremeio, um mandato federal foi conquistado por Lula. Dilma, porém, não traz com ela semelhante experiência.
Ademais, pela primeira vez, um presidente brasileiro consegue eleger quem o sucederá. Esse fato, associado ao de ser uma neófita em palanques a presidente, permite avaliar a diferença de estágio em que nos encontramos. No passado, apostaríamos na derrota da candidata de Lula. A tradição assim o indicava. Mesmo durante a campanha, pode-se sentir a dificuldade de Dilma relacionar-se com o povo, dando a impressão de que sua competência não extravasava dos ambientes onde se desenrola (ou enrola?) a burocracia pública. Em síntese: o eleitorado estava diante de excelente burocrata que, desta vez, pedia votos.
A complicar a situação da candidata hoje presidente, a enorme popularidade do padrinho político, construída sobre a facilidade de entender o povo e falar sua mesma linguagem.
Deu-se, no entanto, o que poucos poderiam esperar – a não ser o próprio Luís Inácio Lula da Silva: a afilhada foi eleita. A impossibilidade de eleger um poste, tantas vezes lembrada durante a campanha, ruiu. Lançada por Lula, por ele bancada, guiada e defendida, Dilma Roussef começa percurso que há de se tornar diferente do antecessor, se ela deseja alcançar aprovação pública pelo menos próxima da dele.
Para tanto, impõe-se mais que a continuidade do governo do padrinho. Lula logrou sair do governo sob o aplauso de 87% dos brasileiros, não sem boas razões. Essas, não há um só órgão de comunicação que as ignore. Os números relativos ao desemprego, à poupança, à exportação, à ciência e tecnologia, ao crédito, ao consumo são por demais conhecidos e têm sido exaustivamente explorados.
Há, todavia, um dado geralmente negligenciado, quando se busca compreender tão elevada taxa de aprovação conferida a Luís Inácio Lula da Silva: o resgate da autoestima de todo um povo. Impalpável, difícil de ser medido, esse sentimento sofreu duros revezes nos oito anos que antecederam o presidente substituído por Dilma. Ao contrário de Lula, Fernando Henrique Cardoso, embalado por vaidade oca, sempre que pode tentou passar a idéia de que, fora ele, todos os demais brasileiros (mesmo seus eleitores) eram incapazes, vagabundos e destituídos de amor-próprio. Daí a posição subalterna assumida diante dos governantes de outras nações, porque tomadas por poderosas e ricas.
Lula, no seu linguajar desatento aos salamaleques diplomáticos, pagou e viu. Falando diferente, não raro cometendo pequenas gafes, acabou por fazer do Brasil um interlocutor respeitado e ouvido. Obama não fez pilhéria, quando o considerou “o cara”. Agora, contadas as pitangas deixadas pelo ex-presidente, aprofundar as conquistas, acelerar a redução das desigualdades, distribuir mais equitativamente a riqueza produzida por todos – devem constituir o grande móvel do governo recém-instalado. Sem isso, padrinho e afilhada comprometerão seu nome perante a história


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