Política

Paulo Afonso - bahia - 26/01/2022

Caso ‘Rapere in Jus’ envolve corrupção na região de Paulo Afonso sobre possível atuação do ex-juiz Rosalino dos Santos Almeida

Jornal GrandeBahia
Leniência do MPBA e o silêncio da OA
Leniência do MPBA e o silêncio da OA

A série de reportagens sobre o ‘Caso ‘Rapere in Jus’ (Justiça em Causa Própria) abrange informações oficiais sobre a investigação promovida pelo Poder Judiciário Estadual da Bahia (PJBA) a respeito da atuação do ex-juiz Rosalino dos Santos Almeida que, à época dos fatos, atuou como titular por 25 anos da 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso e cujos atos podem ter ocorrido em possível conluio com servidores, advogados e empresários através, principalmente, de decisões judiciais envolvendo três tipos de ações judicias:

1) Expurgos Inflacionários;

2) Inventários; e

3) Revisionais.

Circunscrita aos anos de 2015 a 2020, a investigação judicial interna corporis apurou que — ao menos, em 95 processos judiciais do tipo Expurgo Inflacionário promovidos contra o Banco do Brasil (BB) — o esquema pode ter resultado em desvios financeiros da ordem de R$ 150 milhões.

Nas ações sobre Inventários o montante é significativo e o Jornal Grande Bahia (JGB) vai publicar, em outra reportagem, o número dos processos onde a sindicância interna do PJBA identificou possíveis atos ilegais praticados contra os herdeiros dos respectivos espólios judicializados na 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso.

É possível antecipar que o esquema com Inventários, em tese, chegou a operar em outros estados da federação, a exemplo do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Maranhão, a partir de ordens emitidas pelo então juiz.

No caso das Ações Revisionais, o número de processos, partes envolvidas e possível montante desviado está em apuração.

O esquema funcionava com o pedido de financiamento de veículo de luxo por parte do futuro autor da ação judicial que, na sequência, realizava o pagamento de uma, ou algumas parcelas iniciais, para depois ingressar na 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso com pedido de decisão liminar para suspensão dos pagamentos e a manutenção do bem. As evidências apuradas pela sindicância indicam que o juiz atendia os requerimentos liminares e promovia despachos sem obedecer a procedimentos processuais e critérios legais.

Enquanto a investigação judicial sobre Ações Revisionais prossegue, os magistrados titulares estão tomando medidas saneadoras, com exigência de comprovante de residência, cobrança de custas dos autores das ações que estão com a posse dos veículos, e negando liminares pleiteadas.

As medidas adotadas pelos juízes titulares resultaram na significativa redução do número de Ações Revisionais, cujo total de novos pedidos diminuiu de forma considerável.

O núcleo de investigação

A investigação do Caso ‘Rapere in Jus’ teve início a partir de uma representação do Banco do Brasil junto ao CNJ sobre evidências de procedimentos ilegais praticadas pelo juiz Rosalino dos Santos Almeida, titular da 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso, em ações de Expurgos Inflacionários.

O órgão de controle da Justiça, por sua vez, determinou que o PJBA realizasse abertura de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) para apurar os fatos.

A partir deste ponto, o desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) José Alfredo Cerqueira da Silva, Corregedor Geral da Justiça, determinou, em 2019, que a juíza Andréa Cristina de Miranda Costa averiguasse os fatos e produzisse o relatório inicial que apurou as condutas de Rosalino dos Santos Almeida.

Na sequência, foram designados os magistrados Paulo Ramalho Campos Neto e Claudio Santos Pantoja Sobrinho, respectivamente, titulares da 1ª Vara e 2ª Vara dos Feitos relativos às Relações de Consumo, Cíveis e Comerciais da Comarca de Paulo Afonso, em conjunto com dois outros servidores técnicos de confiança dos magistrados para que atuassem na apuração.

Os magistrados se depararam com um quadro de terra arrasada, por assim dizer, em função da extensão dos danos causados à própria imagem da Justiça na região de Paulo Afonso e do extenso número de processos cujas evidências de ilegalidades eram observadas em procedimentos pugnados pelo ex-juiz titular e pela ex-escrivã responsável do Cartório Judicial da 1ª Vara.

Na sequência, o Corregedor Geral da Justiça determinou que o juiz Marcos Adriano Silva Ledo passasse a acompanhar o caso como auxiliar direto da Corregedoria, em conjunto com servidores técnicos do próprio Tribunal de Justiça.

A gravidade dos fatos apurados apontava para a formação de uma possível Organização Criminosa (ORCRIM) que atuou com hierarquia e comando a partir de decisões ilegais proferidas pelo juiz titular da 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso, ao longo de vários anos. Mas, como dito anteriormente, a investigação está concentrada no período de 2015 a 2020.

Magistrados ameaçados 

Destacado pela competência técnica e espírito público no qual atua, o juiz Paulo Ramalho Pessoa de Andrade Campos Neto requereu do Tribunal de Justiça segurança pessoal para ele e para o colega Claudio Pantoja.

O requerimento ao Setor de Segurança do TJBA foi formulado em 14 de dezembro de 2021 e, imediatamente, deferido pelo desembargador Baltazar Miranda Saraiva.

Com exclusividade, o Jornal Grande Bahia teve acesso a cópia do pedido de segurança pessoal, no qual são apresentados os fundamentos do requerimento. Ocorre que relato do magistrado Paulo Ramalho ao Tribunal é estarrecedor, por apontar um quadro de completa incúria no qual se tornou, no passado, o juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso, conforme observa-se nos seguintes trechos do documento:

— O subscrito é Juiz Titular da 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso, Estado da Bahia, e, após assumir a titularidade, em 23/11/2020, deparou-se com inúmeros processos com graves questões processuais que mereceram reparo enérgico em sede jurisdicional.

— Inúmeras ações com distribuição direcionada para a 1ª Vara Cível, ações com bloqueios, transferências e alvarás de levantamento de vultosos valores, em desacordo com as leis vigentes, inventários com tramitação irregular e com graves irregulares indicam que ocorreram graves fatos em diversos processos de Paulo Afonso. Em que houve, aparente, direcionamento indevido de processos para a 1ª Vara Cível de Paulo Afonso/BA.

Na sequência, o magistrado lista 60 números de processos onde apurou evidências de graves ilegalidades em atos promovidos pelo Cartório Judicial da 1ª Vara Cível e em decisões do juiz titular.

Em outro trecho, o juiz Paulo Ramalho lista números de 11 processos “em que houve aparente levantamento ilícito de milhões de reais” e conclui afirmando que:

— Referidos fatos indicam que, em tese, haveria uma organização de pessoas direcionadas para a prática de atos processuais em desacordo com a legalidade estrita, a indicar que a ação era direcionada para intento não amparado na legislação.

— Vários atores processuais e extraprocessuais atuaram, cada um com uma determinada função, visando um aparente conluio reiterado para a prática de atos gravíssimos.

Sociedade deve apoiar trabalho

O trabalho desempenhado pelos magistrados é de fundamental importância para o Sistema de Justiça do Brasil e a sociedade pode e deve atuar no apoio ao trabalho e segurança dos magistrados, ao encaminhar para polícia local relato sobre veículos e pessoas suspeitas que se aproximem das autoridades judiciais encarregadas da apuração dos fatos.

Os PAD abertos 

Ao passo em que os fatos são apurados e injustiças processuais corrigidas, inquéritos administrativos estão em curso e, ou, chegaram ao fim através do Processo Administrativo Disciplinar do TJBA.

Em síntese, até o momento :

16 PADs foram instaurados contra Rosalino dos Santos Almeida, em três deles existe indicativo para pena de aposentadoria compulsória como juiz titular da 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso; e

5 PADs foram instaurados contra Jeane Maria Silva de Melo, ex-escrivã titular do cartório da 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso, em um dos processos existe indicação de demissão a bem do serviço público. Além disso, medidas de restrição de direito proibindo acesso às dependências do Fórum da Comarca de Paulo Afonso estão sendo propostas.

Outros sete servidores sindicados que atuavam nas funções de escrevente de cartório, técnico judiciário e analista judiciário seguem sob investigação, receberam advertência escrita, ou foram absolvidos. Mas, todos os sindicados deixaram de atuar na 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso.

Leniência do MPBA e o silêncio da OAB

Como visto até aqui, a investigação judicial do Caso ‘Rapere in Jus’ é uma das mais amplas em curso no Brasil sobre a atuação de possível esquema no qual teve a centralidade de um único juiz.

Observa-se que questões permanecem em aberto, a exemplo da possível responsabilização criminal dos investigados.

Todavia, o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO) do Ministério Público da Bahia (MPBA) tenha recebido boa parte do resultado da investigação judicial, não se sabe porque até o momento não atuou para responsabilizar criminalmente os envolvidos.

Na outra vertente, os fatos e documentos indicam que cerca de 10 advogados, com escritório em Salvador, Paulo Afonso, Aracaju e Juazeiro podem, em tese, ter sido parte do esquema envolvendo o juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Paulo Afonso. Sob este ponto, não se tem notícia de apuração e ou responsabilização dos mesmos.

Na ponta, estão as partes autoras dos processos judiciais, para as quais não se pode afirmar, até o momento, se atuaram no esquema, ou se apenas tiveram os nomes utilizados para promover as fraudes.

Novas reportagens 

Por fim, aos leitores do Site a certeza de que novas reportagens serão levadas à público, porque a documentação levantada é ampla e os fatos a serem noticiados são de relevante interesse público.


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