Opinião

Paulo Afonso - Bahia - 30/06/2019

*Promiscuidade condenatória*

Fábio Almeida é advogado
(Foto: divulgação)

Diante dos *vazamentos de conversas entre o ex-juiz Moro e Procuradores Federais que atuaram e trabalham na Operação Lava-Jato em uma rede social*, surgiram críticas por parte de opositores ao atual governo, defesas ferrenhas dos partidários e manifestações de órgãos ligados a Justiça, como a Associação de Juízes Federais – AJUFE, Procuradoria Geral da República-PGR e da Ordem dos Advogados do Brasil-OAB.

Indefensável obviamente as práticas dos hackers. Os vazamentos são irremediavelmente imorais e ilegais, porque obtidos de forma ilícita. Eles afrontam o direito à privacidade do cidadão, seja ele comum ou agente público e devem ser combatidos e punidos severamente. Então, *por que a notícia de troca de figurinhas entre o juiz Moro e os Procuradores trazem tanta discussão?*

Ouvimos diversas opiniões, dentre elas, a de especialistas e de leigos. Beiramos ao absurdo em muitas delas, disparadas por defensores e críticos da intimidade institucional entre juiz e promotor: “não vejo nada demais, juízes e advogados também conversam”; “as conversas somente ratificam o conluio entre o juiz Moro e os procuradores”; “o juiz também pode atender advogados e as partes”; “houve uma quebra de imparcialidade do juiz”; “tudo é válido para prender corruptos”; “querem atacar o Ministro que acabou com a roubalheira do PT”; “é comum haver embargos auriculares ao juiz...” (essa foi a melhor, criaram um novo recurso - espúrio), etc.

Há muito que a defesa (advogados de Lula) vem reclamando da quebra da imparcialidade por parte do ex-Juiz Moro, inclusive constam dos recursos, ainda em análise. Os Procuradores Federais e Juízes se defendem afirmando que Lula foi acompanhado todo o tempo por uma banca de advogados e lhe foi oportunizada ampla defesa e o contraditório.

Não se pretende aqui adentrar no mérito da questão da ação penal do Triplex do Guarujá, se Lula é culpado ou inocente. Isso cabe a Justiça dizer, quando o processo transitar em julgado (final do processo quando não cabe mais recurso); nem também se a prisão poderia ocorrer após a decisão de segunda instância ou no final do processo. *Apenas vamos percorrer o caminho que se trilhou para chegar a sentença que condenou Lula* e está pendente de recurso no Superior Tribunal de Justiça-STJ.

Procuremos nos despir dos partidarismos, das paixões ideológicas, se é que ainda existem; e principalmente dos facciosismos por falsos ídolos e heróis. As opiniões são divergentes e nos obrigam a fazer uma reflexão. *Para a Justiça, os fins justificam os meios?*

Todo processo judicial tem um percurso a fazer: com fases, procedimentos e prazos a serem cumpridos, todos obrigatórios, e uma vez inobservados podem anular o processo. *Ratifico que anulação de um processo não redunda em absolvição ou inocência do Acusado.*

A contrário senso, lembremos que *no sistema judicial brasileiro não há hierarquia entre juízes, promotores e advogados.* Cada um tem o seu papel em um processo: o juiz preside os atos e julga a ação; o Promotor representa o interesse coletivo, o Estado, acusa e busca condenar o Réu; e o advogado ou defensor público, exerce o múnus público de garantir ao Réu um julgamento justo e de acordo com a lei, visando absolver ou minorar a pena do Acusado. Assim, *deve existir independência, autonomia, respeito e urbanidade entre juízes, procuradores e advogados.*

*O Procurador e Advogado são partes no processo, que buscam interesses opostos, mas sempre devem ter paridade de armas em sua atuação,* para que não haja beneficiamento de um em detrimento do outro. O Magistrado (Estado Juiz) deve presidir o processo sempre de forma imparcial e sem se inclinar para um dos lados, sob pena de comprometer a lisura de suas decisões. O juiz não pode proferir manifestações, dentro ou fora do processo, antecipando seu entendimento sobre os fatos, sob pena de fazer um prejulgamento, inadmissível para quem deve ser imparcial.

Retoricamente, imagine que você, cidadão comum, tivesse sua casa invadida por policiais, à noite, sem um mandado judicial, para fazer uma busca e apreensão por seus celulares e computadores em razão da suposta prática do crime de difamação nas redes sociais; e que fosse comprovada a acusação da polícia. Você foi condenado. Descobriu-se que durante o processo, o Ministério Público e o Juiz tinham conhecimento oficioso da invasão domiciliar ilegal, mas defenderam ser legítima porque a polícia encontrou as provas e puniu o criminoso. Estaria justificada a invasão de domicílio, o recolhimentos de celulares e computadores, e sua condenação? 

O magistrado não deve aconselhar qualquer uma das partes sobre o processo que ele preside, sob pena de configurar suspeição em sua atuação.* O juiz deve sempre ser imparcial e inerte, pois atua somente quando provocado e no processo, e uma vez instigado deve dizer o direito, ou seja, no final do processo julga se aquela ação penal, é ou não procedente, com base nas provas produzidas.

O celular do ex-juiz Sérgio Moro foi entregue a polícia federal e será periciado. Os Procuradores também deveriam fazer o mesmo, já que dizem não haver neles nada que comprometa a atuação do Ministério Público e do ex-juiz. Só assim saberemos se as conversas divulgadas são autenticas ou não. Até lá, tudo não passa de especulação, as quais sendo comprovadas, trarão consequências para os agentes públicos e para os processos penais julgados pela 13ª Vara Federal de Curitiba/PR, quando presidida pelos ex-juiz Moro.

A possível promiscuidade condenatória entre juiz e procuradores traz uma repulsa para a sociedade e juristas, ainda maior que as dos vazamentos, por que estes desnudam uma prática vil e condenável para agentes públicos (e da justiça), dos quais esperamos práticas morais e éticas, pois eles dispõem de todas as armas para combater a criminalidade e devem usá-las de acordo com a legislação, para não levar suas atuações à margem da lei e comprometer o resultado dos processos. *Por isso que os fins, ainda que louváveis, jamais irão justificar os escusos e reprováveis meios, principalmente por um representante do Estado.*

 

Fábio Almeida é advogado


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