Como esperado, ruas e avenidas de Salvador, até há pouco desertas e amedrontadas por conta das mortes e assaltos acima do padrão baiano de normalidade, foram tomadas por uma animada moçada agitando os braços para o ar, não por conta do temido "mãos ao alto" que
prevaleceu durante o período de rebeldias fardadas motivadas por governantes vacilões, mas, sim, obedecendo a voz das verdadeiras autoridades baianas quando o assunto é " joga as mãos pra cima e vai". Deste modo, pelo menos por uns dias Salvador deixou de ser a cidade do caos para voltar a ser a terra da pseudofelicidade, tudo sob os auspícios do general Bell Marques, coronel Durval Lélys e da bombeira fake Daniela, cuja performance soa tão verdadeira quanto à animação de João Henrique na pipoca do Chiclete. Mas o que me incomoda não é a qualidade musical ofertada (alguma dúvida de que já fomos mais felizes?) nem a má gestão que atinge Salvador, pois isso se resolve com voto e mute.
O que me preocupa é ver os baianos, antes vanguardeiros em vários aspectos, perdendo o expresso 2222 da história e se acostumando com a mediocridade reinante. E tome estádios cheios para jogos fraquíssimos narrados por camaradas que parecem nunca ter ouvido falar em Armando Oliveira ou Ivan Pedro; e tome apresentadores e repórteres de tevês sem nenhum conhecimento daquilo que falam; e tome livrarias frequentadas por uma galera que dá a impressão de estar ali apenas olhando as figuras enquanto começa um show de pagode nas proximidades; e tome artistas que sequer amarrariam a correia do violão de Tom Zé, mas que, por afagos de velhos tropicalistas que moram longe, dilatam o ego de tal forma que se acham da mesma casta da geração daqueles que os elogiam; e tome políticos com a velha visão "azul da cor do mar" de que a Bahia é só litoral, deixando o interior a ver catinga; e tome sujeitos com camisas Ralph Lauren discutindo ações para os cafundós do sertão... Enquanto isso, o prefeito, paixão tatuada no braço, assovia a flor do desejo e do maracujá. Ômi, quá, me faça uma garapa!
Material extraído do jornal A tarde