No exato momento em que Dilma faz um périplo pelo Nordeste, para agradecer os votos que recebeu na região, e Aécio Neves marca visita a Pernambuco, para tomar um banho de povo com os socialistas, o mundo real manda lembranças.
Neste sábado, depois de a Chesf ter ligado as primeiras subestações de suporte ao projeto da Transposição do São Francisco, em Floresta, ocorrerá o primeiro teste dos canais, com a água captada do lago de Itaparica, às margens da cidade de Petrolândia.
O problema é que o lago, reservatório da Usina Hidrelétrica Luiz Gonzaga, construída em Petrolândia, está em situação crítica, com apenas com 17,23% da sua capacidade total, de acordo com relatórios oficiais.
Neste final de semana, devem ser ligadas duas das quatro bombas no Canal da Transposição do Eixo Leste (Floresta), para testes, acirrando a disputa pelo uso da água entre abastecimento humano e produção versus a produção de energia.
“Todas as tentativas de diálogos com Chesf, ONS e ANA a resposta tem sido a mesma. Eles nos dizem que temos de garantir a produção elétrica porque a crise energética, somada a seca, levou o sisyema a beira de um colapso. Não consigo entender como é mais importante produzir energia em detrimento de manter água para a vida das pessoas”, diz o prefeito de Itaparica, Lourivaldo Simões, do PR.
Em um documento interno, a Chesf informa as cotas dos Lagos de Sobradinho, Itaparica, Apolônio Sales e Xingó, no período de 03 a 10 de outubro. No boletim, o volume informado é 17%. Essa é a previsão sem a ligação dos dois conjuntos de motor bombas do teste da transposição, que subtrairia 1% do lago.
Imagem para o programa eleitoral
“Não sei se de repente vamos assistir nos guias eleitorais que o Canal da Transposição está funcionando para enrolar os sulistas. Sei que essa ligação consumirá 1% do Lago. A Chesf já nos informou que, sem ele funcionar, já iremos ter apenas 16,5% na próxima segunda feira. Me pergunto para que ligar se não há destino para essa água e nós estamos em beira ao colapso. É no mínimo estranho tirar algo de onde se esta precisando e levando para onde não se tem o que abastecer. Que se pese o interesse em se levar água aos irmãos do sertão brasileiro, porém o momento não é adequado porque nós não temos nem para nós mesmos”, reclama o prefeito Lourival Simões.
No final de agosto, a candidata à reeleição pelo PT e o ex-presidente Lula percorreram o Sertão de Pernambuco para vistoriar as obras da Transposição do Rio São Francisco. Depois de passar por Cabrobó, a dupla seguiu para Floresta com o objetivo de gravar imagens para a propaganda eleitoral nas cidades cortadas pela obra. Quanto aos atrasos na entrega do projeto, previsto inicialmente para ser finalizado em 2010, Dilma foi categórica. “Só não atrasa obra quem não faz. Aqueles que nunca fizeram obra no Brasil, que nunca deixaram obras atrasadas, são aqueles que nunca planejaram”, afirmou a candidata.
“Só não atrasa quem não faz. E a gente fez grandes obras”, diz Dilma, ao visitar transposição
De acordo com os levantamentos da municipalidade, os volumes da operação da ONS para esvaziar o Lago de Itaparica somente foi visto na Seca de 2001. “Esse esvaziamento do Lago de Itaparica é duvidoso do ponto de vista de otimização energética, dada a situação atual de nível de água dos reservatórios do Brasil, grau de geração eólica e térmica na região nordeste”.
Produção econômica em crise
“Hoje em Petrolândia os quase 5.000 hectares de área irrigadas estão sendo obrigados a funcionar no rodízio de bombeamento. Há comunidades já prejudicadas, como o Brejinho de Fora, sem que se consiga bombear água para consumo humano”.
“O perímetro irrigado as fruteiras já estão abortando seus frutos. Teremos uma queda muito grande na produção e aqui não se trata de grandes empresários. São pequenos agricultores como tantos e tantos outros espalhados por esse Brasil afora. Que se mude a estratégia de esvaziamento do Lago de Itaparica para produção de energia”, afirma o prefeito.
Na noite da última quarta-feira (7), o prefeito visitou a sede da Chesf em Recife para tratar da situação crítica da represa, mas saiu decepcionado.
“A Chesf sabe o que tem de fazer porém ela esta de pés e mãos atadas pela ONS e por conseguinte pela ANA. Já fizemos comunicados, trocamos e-mail, reuniões porém a resposta seca esta na ponta daqueles que estão distantes de nós e que olham simplesmente números. Nossa preocupação maior é a geração de energia. Chega! Gente é mais importante”, diz.
A construção da Usina Hidrelétrica Luiz Gonzaga, em Petrolândia, no Sertão de Pernambuco, foi realizada pela CHESF do final dos anos 70 até meados de 1980. A sede e vários distritos e povoados foram submersos para a criação da represa de Itaparica, com a transferência da sede do município para outra área, o mesmo acontecendo no município de Itacuruba. Cidades baianas também foram afetadas.
“No momento, parece que perdemos nossas cidades a troco de um progresso ilusório, tão fugaz quanto uma boa temporada de chuvas neste Sertão, cada ano mais castigado pelos desatinos do homem. Arrancaram nosso povo de suas terras e águas e parte de nossa história se perdeu no fundo dessas águas, crescentemente contaminadas por agrotóxicos. Em troca, sequer o direito fundamental à vida – porque água é vida – à dignidade nos são garantidos, porque a produção de energia é mais importante do que a manutenção do mínimo de qualidade de vida das milhares de pessoas aqui residentes. Que os céus mandem logo chuva, antes que a represa nos devolva, coberto de lama, tudo aquilo que nos foi tirado”.
Gravidade
No final de agosto, o Ministério da Integração Nacional informou ao Blog que a obra começaria a ser entregue ainda este ano. A Meta 1L, de 16 km, localizada em Floresta (PE), já havia entrado em fase pré-operacional. Os primeiros seis quilômetros estão preenchidos com água no canal de aproximação, que vai da Barragem de Itaparica até a estação de bombeamento EBV1. Sem data definida, informou-se que as bombas começam a funcionar, impulsionando água a mais de 62 metros de altura, seguindo daí por gravidade até o reservatório de Areias.
O objetivo do projeto é levar água para mais de 12 milhões de moradores de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. O relatório de execução física de julho mostrava que o empreendimento está 62,4% concluído. As obras seguiam então com 11.400 trabalhadores e mais de 3.900 máquinas em ação.
A obra, orçada em R$ 8,2 bilhões, tem dois longos canais. O Eixo Leste beneficiará Pernambuco e Paraíba e o Norte levará água para esses Estados, o Ceará e Rio Grande do Norte. A obra começou em 2007, na gestão Luiz Inácio Lula da Silva, orçada em R$ 4,5 bilhões. O Eixo Leste deveria sair em 2010 e o Norte, em 2012.
Fonte/Autor: Por Jamildo Melo