Funcionária da Câmara Municipal de Paulo Afonso, há 35 anos, bacharelada em direito e pedagoga, a diretora da UNISA (Polo Paulo Afonso) Maria Gorete Moreira foi candidata duas vezes a uma vaga na Câmara Municipal, pelas óbvias qualidades reconhecidas por quem convive com ela em sua rotina, e, principalmente, pela vontade de ser uma voz feminina atuante no legislativo.
Hoje descontente com as circunstância em que se exerce a política, Gorete, como gosta de ser chamada, faz uma análise das questões que inviabilizam o ingresso dessas mulheres no legislativo aqui de Paulo Afonso. “Culturalmente esmagamos muito uma a outra” analisa, abaixo segue a entrevista que ela concedeu ao site JeanRoubert.com.br, em seu escritório, na Câmara Municipal.
JR – Há Quanto tempo a senhora trabalha aqui na Câmara Municipal de Paulo Afonso?
Gorete Moreira – Comecei trabalhar aqui na Câmara ainda na década de 1970, mais precisamente no dia 1 de novembro de 1977. Em 1975 a prefeitura municipal implantou o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) aqui em Paulo Afonso, eu estudava contabilidade, estudei no Benjamin Sodré. À época foi requisitado alguns alunos para trabalhar na prefeitura, o critério era pela nota – como se fora hoje um Menor Aprendiz, eu contava meus 16 anos, então em 1977 aconteceu um concurso para a Câmara Municipal, ainda que não tenha sido muito divulgado, no período não era um requisito obrigatório na Constituição, e entre essas 26 pessoas eu fui uma das escolhidas.
Gorete Moreira – Foi por mérito e eu passei por todas as etapas: prova de datilografia, de redação e dos currículos. De qualquer maneira eu me sinto feliz por esse ingresso, porque não fui indicada, tive obviamente a indicação de participar, mas chegando aqui passei pelos meus méritos.
RJ – No corpo funcional da Câmara há muitas mulheres: secretárias, copeiras, faxineiras, na gerencia etc., entretanto, como vereadora sabe-se que foram poucas que passaram por aqui, então com toda sua experiência a que a senhora atribui essa lacuna?
Gorete Moreira – Na verdade trata-se de uma questão cultural, nós mulheres participamos de todas as transformações do mundo, mas essas transformações da sociedade e psicologia, ainda não conseguiu transformar a mulher para que ela entenda a outra mulher. Entender que você está concorrendo no mundo de forma igual e mais: você sai candidata por ter condição, tem conhecimento para participar do legislativo. Já aconteceu comigo mesma quando fui candidata, por duas vezes, eu ouvia de outras mulheres: “mas por que você quer ser candidata?” eu respondia sempre: “para trabalhar de forma diferente até para nós mulheres”, mas sentia sempre certa rejeição. Então, muitas vezes, a mulher sem se dar conta se pretere votando num homem. Culturalmente esmagamos muito uma a outra. O processo é cultural e de evolução da própria mulher no meio da sociedade.
JR – A mulher ainda não entende ou enxerga essa necessidade de representação?
Gorete Moreira – Não com a gravidade que se deve. Nós pensamos de forma diferente, temos os mesmos objetivos, mas nosso pensamento de mulher é outro, quer seja pela concepção de vida, pelo que enfrentamos no dia a dia, como machismo ainda é grande, então nós enxergamos de maneira particular a nossa situação: política, biológica, econômica e social, a dificuldade está justamente em convencer a própria mulher disso.
JR- Quais caminhos a mulher que deseja se aventurar na política deve seguir, já que de toda sorte as mulheres participam em maior número do processo político?
Gorete Moreira – É difícil para eu responder, até porque fui candidata duas vezes, em situações diferentes. E é uma pergunta sem resposta diante da forma de fazer política que vemos. O eleitor me decepcionou, hoje eu não sairia candidata porque não quero entrar nesse jogo. Aquela pessoa que eu gostaria de representar não vejo mais hoje, porém, não se justifica a ausência de uma mulher na Câmara, ainda que não fosse a “mulher ideal” mas ela é necessária.
JR – No último dia 8 de março a Câmara homenageou as mulheres, então a lembrança e as ações de políticas públicas tendo em vista o bem-estar da mulher é uma preocupação da casa ou é apenas uma formalidade pela data?
Gorete Moreira – É preciso dizer que não apenas aqui, mais no Brasil esse processo é precário, estamos minimizando Paulo Afonso, mas eu vou colocar de uma maneira mais ampla, na verdade essas políticas públicas ainda é muito difícil.
Com a eleição da presidente falou-se muito que era a vez da mulher, porém, os homens precisam está representados, contudo, aqui na Câmara já fizeram ações importantes, com visão mais apropriada para a mulher, justamente quando algumas vereadoras compuseram a Câmara, Dra. Francisca, Ivonete, Vanessa, Maria José etc., essas pessoas foram importantíssima para, por exemplo, conseguir a Delegacia da Mulher, o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher.
Então essa natureza transformadora é muito nossa. Quando a mulher adquire um conhecimento técnico e teórico ela faz a diferença. O problema é que só se enxerga a mulher, falando agora dos partidos, para compor uma cota obrigatória, não se vê uma possibilidade de elegê-la pelas suas qualidades, ela vai apenas “compor” porque assim determina a Constituição. Daí começa um processo extremamente desgastante, o partido não lhe dá a condição de concorrente.
Fonte/Autor: Jean Roubert