Em vigor desde abril, a chamada “Lei das Domésticas”, que equipara os diretos das empregadas domésticas ao restante dos trabalhadores, vem provocando uma série de mudanças na vida das profissionais e das famílias que precisam da prestação deste serviço e que agora precisam se moldar às novas determinações.
A insegurança por parte dos 'patrões', a elevação no custo familiar, aliado à crescente exigência de direitos das empregadas domésticas seriam alguns dos fatores que contribuem para esta reconfiguração do mercado serviços e que já vem impactando a rotina das famílias paraibanas.
Segundo a advogada Maria Lúcia de Almeida, representante da Dona Legal, empresa que faz o intermédio entre empregado e empregador, a nova lei precisa de muito para se solidificar.
“Houve um impacto social grande. A princípio houveram muitos desligamentos e percebemos tensões de ambos os lados. O empregador quer se inserir nas novas regras, mas existem muitas dúvidas. O que vai se fazer com a empregada que vem do interior? Ela vai poder dormir? Muitas empregadas não se adaptaram, por isso está gerando os problemas”, disse a advogada. Desde abril deste ano foram 200 desligamentos de empregadas registrados pela associação.
Para conseguir cumprir com as determinações da lei, a odontóloga Kalina Fernandes teve que contratar uma diarista para auxiliar nos serviços domésticos. “Meu apartamento não é tão pequeno e a diarista ajuda minha funcionária doméstica uma vez por semana. Assim eu não sobrecarrego o horário da empregada”, disse.
Para outros consumidores, entretanto, a solução da odontóloga é inviável, pelo alto custo financeiro. Este cenário contribui para que novos serviços possam obter crescimentos significativos. Berçários, escolas de período integral e até mesmo lavanderias já demonstram aumento na demanda desde a validação da lei.
Com 81 crianças matriculadas, o berçário Baby's Cool, localizado no bairro de Manaíra, em João Pessoa, obteve crescimento de 25% em sua demanda. De acordo com a coordenadora da instituição, Nicolle Chevitarese, os primeiros sinais após a PEC das domésticas foi negativo, mas hoje o cenário é bem diferente.
“O primeiro impacto foi ruim, porque os pais tiraram os filhos do berçário para dar preferência ao trabalho da babá, já que arcar com os dois serviços ficou muito caro. Só que muitas das babás criaram força e conhecimento sobre a lei e optaram por deixar os empregos, buscando melhores oportunidades em outras residências”, disse a coordenadora da Baby's Cool.
Devido à saída das empregadas domésticas, os pais refletiram acerca da importância do berçário, gerando crescimento na procura. “Desde o mês de junho estamos tendo crescimento. Os pais perceberam que seria mais interessante colocar os filhos no berçário, já que aqui eles contam com uma grande equipe que pode cuidar das crianças por um período de tempo maior”, disse Nicolle. Na nova legislação, as babás só podem trabalhar 8h por dia. As crianças matriculadas no berçário, entretanto, podem ficar até 11h corridas sob os cuidados dos profissionais, das 7h30 às 18h30.
LEI PROVOCA RESISTÊNCIA NOS PATRÕES
O auxílio alimentação e de transportes, a carga de 8h por dia, o recebimento do salário mínimo (R$ 678) e do 13º salário são direitos das empregadas domésticas desde abril deste ano. Entretanto a presidente do Sindicato das Empregadas Domésticas da Paraíba, Rejane Santos, informou que ainda há forte resistência por parte dos patrões.
“A cada dez empregadas domésticas, apenas uma tem a carteira assinada. Elas ainda têm medo de exigir seus direitos e muitos patrões ameaçam demitir caso elas cobrem”, disse.
A representante das domésticas, nem o MTE souberam precisar quantas empregadas domésticas com carteira assinada existem no Estado.
Outros itens já estão garantidos pela nova lei, mas precisam ser regulamentados. Ainda não foi acertado, por exemplo, quem será o responsável pelo pagamento da contribuição do FGTS. Também não ficou esclarecido como será o trabalho daqueles que exercem funções como babá e cuidador de idoso, que não costumam ter um horário estável de trabalho. Também é incerto quem ficará responsável pela fiscalização da nova lei, uma vez que, como é um bem inviolável, as residências não podem ser fiscalizadas pelo MTE.
MUDANÇAS PROVOCAM DEMISSÃO NOS LARES
As mudanças advindas com a nova lei vêm influenciando a rotina das famílias, que passam a procurar variados serviços para suprir a presença da empregada doméstica. A professora universitária Danielle Vasconcelos, por exemplo, reconfigurou toda sua casa após a “Lei das Domésticas”. Os dois filhos, um menino de 9 anos e uma de 2 anos e meio, passaram a frequentar escolas em período integral. Ela e o marido já não fazem mais as refeições em casa.
Segundo Danielle Vasconcelos, as mudanças ocorreram logo após o aparecimento da nova lei. “Nossa 'secretária' pediu demissão assim que saiu a lei. Eu e meu marido conversamos bastante e chegamos à conclusão que seria melhor não contratar uma nova porque ia ficar mais caro e complicado”, disse a professora.
Além do maior custo financeiro, a opção por substituir o serviço da doméstica se deu pela insegurança que se encontra este segmento, afirmou Danielle. “Nós ainda temos muitas dúvidas. Quer queira ou não existe certo receio em contratar".
GASTOS PODEM CHEGAR A R$ 2.034
Na ponta do lápis, é possível perceber que o perfil dos consumidores vem mudando e nem todos podem arcar com os serviços das empregadas domésticas. Em uma residência onde o serviço seja oferecido a um idoso, por exemplo, que necessite de cuidados 24h por dia, será necessária a contratação de pelo menos três empregadas, que trabalharão em períodos alternados, por até 8h, recebendo pelo menos R$ 678 cada, valor do salário mínimo.
Por mês, o empregador gastará R$ 2.034. Por ano, o valor será R$ 24.408, equivalente ao preço de um carro popular ou uma entrada no financiamento do apartamento próprio em um bairro classe média. Este valor pode ficar ainda maior, quando somado o pagamento do 13º salário e de outros benefícios que agora são garantidos às empregadas domésticas.
Neste novo cenário, a tendência é que os serviços das empregadas domésticas se tornem cada vez mais restritos àqueles com maior poder aquisitivo. O superintendente do Ministério do Trabalho e Emprego na Paraíba (MTE-PB), Rodolfo Ramalho, disse que mudanças significativas, como no caso da “Lei das Domésticas”, tendem a causar transformações na sociedade.
“A lei dificulta para os consumidores quem não têm condições financeiras, mas é um beneficio para a categoria das empregadas domésticas, elas passam a ser reconhecidas. Para que você tenha um empregado que vai estar frequentemente lhe servindo vai ter que arcar com esses custos. Esse tipo de mudança é necessária. Para esta categoria garantir seus direitos, alguém vai ter que arcar com isso. É uma categoria a menos que está excluída”, defendeu o superintendente do MTE.
Fonte/Autor: Beto Pessoa